No último dia 30 de maio, foram organizadas manifestações
com o intuito alegado de defender a educação e protestar contra o
contingenciamento de R$ 5,8 bilhões anunciado pelo MEC. Trata-se da segunda
mobilização nacional em menos de um mês realizada com a mesma finalidade. O
referido contingenciamento tem sido tema onipresente em veículos de informação,
editoriais jornalísticos e redes sociais, de onde se depreende que a comoção em
torno do tema deve-se à suposta severidade (ou talvez descaso) com que o governo
recém-eleito vem tratando esse importante setor.
Os fatos, contudo, não legitimam essa postura. Vamos,
portanto, a eles.
Desde o início da crise econômica em 2014, o governo federal
vem fazendo sucessivos cortes orçamentários na área da educação. Com base nos
dados disponibilizados pelo Portal da Transparência, e compilados no gráfico
abaixo, percebe-se que, mesmo que o contingenciamento recém anunciado de fato
se transformasse integralmente em um corte efetivo, ele se revelaria o menor
corte da série histórica, representando cerca de 1/3 do corte médio adotado
pelas últimas gestões federais (5% ante uma média de 16,2% entre 2015 e 2018).
O maior corte em termos percentuais foi efetuado em 2015,
durante a gestão petista, o qual atingiu 23,3% do orçamento.
Como se não bastasse, assumindo novamente que tal
contingenciamento venha a se transformar em corte integral, os números demonstram
que, mesmo assim, o investimento federal em educação realizado pela atual
gestão terá sido o maior da história, atingindo um patamar de R$ 111,3 bilhões.
Logo, as recentes escolhas orçamentárias na área da educação
não fornecem elementos que indiquem a alegada severidade ou descaso do atual
governo para com esse setor. Os fatos, aliás, como visto, demonstram o
contrário.
Fonte: Portal da Transparência – *Nota: Para o ano de 2019
considerou-se que o valor executado pelo governo seja dado pela diferença entre
o orçamento e o valor contingenciado.
Se as evidências acima mencionadas não conferem elementos
para se constatar que o atual governo afronta a educação em nosso país, uma
explicação alternativa para a ampla manifestação em defesa desse setor poderia
decorrer da possibilidade de que tal corte represente um “tiro de misericórdia”
em uma área cujo investimento público vem minguando. Contudo, uma vez mais, os
fatos contradizem também essa hipótese. Segundo dados compilados pelo Senado
Federal, entre 2004 e 2014 o investimento público em educação proporcional ao
PIB cresceu espantosos 130%, sendo que no ano de 2018 representou 6% da riqueza
gerada no país, patamar acima da média da OCDE, e de países desenvolvidos como
Alemanha, Holanda, Reino Unido e Suécia, por exemplo, conforme divulgado por
essa organização. Aliás, segundo o último relatório dessa entidade, somente 6
países dos 43 pesquisados investem mais em educação do que o Brasil. Assim, a
retórica de escasso investimento em educação sendo dilapidado pelo mais novo
contingenciamento tampouco se sustenta.
A análise atenta dos dados compilados pela OCDE no âmbito
educacional talvez nos dê uma pista do que poderia, enfim, legitimar as
referidas manifestações. A despeito do massivo investimento educacional
protagonizado pelo governo nos últimos 15 anos, o desempenho obtido por nossos
alunos no PISA mostra-se estagnado ao longo das 6 edições do referido exame. Quando
colocado em relação a outros países, o quadro piora sensivelmente, visto que
nossa posição caiu de 36º para 65º entre a primeira e a última edição.
Ou seja, se formos fiéis ao axioma de que recursos
destinados à educação “não é gasto, mas investimento”, o retorno que nossa
sociedade está obtendo tem sido péssimo. Presumo que esse seja o motivo
subjacente às manifestações de hoje, afinal, conforme demonstrado acima, o
contingenciamento anunciado pelo atual governo é bastante aquém dos
protagonizados pelos anteriores (sem que houvesse comoção comparável à atual),
e nosso investimento em educação supera o realizado pela maioria das nações
desenvolvidas. Dessa forma, recai no mau uso do recurso público em educação o
real fundamento das manifestações protagonizadas por nossos estudantes nesta
data.
É claro que uma explicação alternativa seria uma possível
motivação política arquitetada por partidos de oposição que, de maneira
oportunista, se utilizariam de tais estudantes como fantoches para promoverem
suas pautas particulares. Ora, não podemos esquecer que a esmagadora maioria
desses jovens possui bom discernimento dado que tiveram o privilégio de estudar
filosofia e sociologia em suas escolas, as quais, por sinal são isentas de viés
político. Acho, portanto, pouco verossímil essa última possibilidade…
Fontes:
https://www.gazetadopovo.com.br/educacao/peru-e-chile-gastam-menos-em-educacao-do-que-o-brasil-e-eles-alcancam-as-melhores-notas-5mo5nrw7yq9poa113h8ioj4r0/
https://data.oecd.org/eduresource/public-spending-on-education.htm
https://www.oecd.org/eco/surveys/Brazil-2018-OECD-economic-survey-overview-Portuguese.pdf
http://www.portaltransparencia.gov.br/funcoes/12-educacao?ano=2017
https://www12.senado.leg.br/publicacoes/estudos-legislativos/tipos-de-estudos/boletins-legislativos/bol26
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